sábado, 17 de julho de 2010

A intensidade do par do desencontro

Li uma vez que só nos lembramos das coisas que esquecemos. Nunca concluiria isso sozinha e a partir dessas palavras dei-me conta que a ideia de ti não me chega nem parte, é permanente no tempo que me ocupa. Tempo. Minto com todas as cinco letras dessa palavra quando o digo exclusivamente, porque tens a ousadia de ocupar mais do que isso em mim. Ocupas espaço, tanto espaço que não sei se existe mais de ti ou de mim nesta carapaça.
Chama-me pelo teu nome. Chama-me e verás que reajo como se me chamassem pelo meu. Onde me marcaste tanto? Parece que são mesmo mais marcantes as pegadas que se deixam na alma. Serei só amor? Um véu tão simples, profundo em transparência? Que marcos separam a fronteira do que é pessoa e do que é sentimento? Não entendo, tão depressa me estou a ver a mim, encantada com passos (re)pensados, como depressa me misturo com uma coisa que não tem nome e deixo de me saber localizar, absorta num sentimento que me ocupa na totalidade.
É por não darmos um nome ao que somos que isto se torna grande? Brutal, desacreditado aos olhos dos outros? Ou não lhe damos um nome porque, sem intenção, não temos a coragem de definir um futuro para nós definitivo? Temos medo?
Já falo por ti e por mim. Foi como referi, às tantas linhas já deixo de ser eu e perco-me nos contornos. Mas não será isto realmente o receio de termos que assumir uma fraqueza de quem nunca foi ensinado a desperdiçar o que o faz feliz, mas que ainda assim o aprendeu sabe-se lá por que meios? Como é que chegámos aqui?
Sempre tive a esperança que em vez de Roma, todos os caminhos fossem dar ao amor. Não me façam caso, por alguma razão dizem que a experiência dos experimentados em matéria de idade e de vida é maior que a dos loucos apaixonados.
Às vezes, tantas vezes, perdemos ambos o norte. E durante a noite agarramo-nos ao que nunca vai mudar, presos a uma escolha que erroneamente apelidas de «melhor».
Tinhas razão ao dizer que o quanto gostavas, bastava dizeres-mo poucas vezes. Eu sentia-o, não precisava que gastasses as palavras mais sinceras porque é assim que os outros as tornam banais, com o sentido fugido para uma rotina condenada. Mas as repetições de que os passos que damos são o mais benéfico? Em que mundo vives? No mesmo em que confessámos a nossa felicidade ou a falta dela? Ocupo tempo a perguntar-me se as coisas que mais se repetem são aquelas de que ainda precisas de te convencer. Imagino-te, a cada vez que mo dizes, a proferires para ti vezes sem conta três das palavras que há horas me disseste, como quem estuda um livro maçador e precisa de repetir o texto mais vezes do que seria realmente necessário para que as palavras comecem a fazer sentido na cabeça. Um processo de mecanização, portanto. Será isso? Será que a solução para te desligares passa por um automatismo que se desencadeia em ti sempre que pensas em mim? Pois recordo-me de no início lutares contra o que querias. Agora não sei sequer a favor de que batalhas te levantas.
Onde está o sentido deste par de desencontrados, que a nada nomeia, que tudo não compreende? É tudo diferente mas tão intenso que nem se sabe explicar.
Continuo a dizer que prefiro fingir que esta é a única forma que vamos encontrando de viver um amor que vai durar para sempre. Prefiro acreditar que estamos nas palavras que não são ditas, nas noites que pertencem a dias que não são nossos e em tudo o que deixámos por fazer. Precisei, para bem da minha senilidade, de inventar esse sentido para me apaziguar com o que não entendo. Por que de outra forma: o que é que essa história ainda significa?
Peço-te que não contraries a maior certeza que tenho na vida. São palavras que desperdiças, ignorantes como aqueles que nunca amaram. Como é que uma mentira dessas te sai tão facilmente dos lábios que deixei?
O que há em nós que não nos deixa partir por completo e muito mais nos obriga a ser incompletos com o lugar do lado preenchido? Que prioridades passámos a estabelecer no clarear do futuro?
Mesmo avistando o norte, não há barco que pare para o fazer regressar. Avisto-o como um futuro no reflexo do passado, escondido atrás de nuvens altas que o céu não escolheu deixar ficar.
Os dias esvaziam-me, ainda não reparaste? E a ti? Escreve-me sobre ti. Não tem que ser sobre o que não te peço, mas do que me falta conhecer daquilo que és agora. Sei-te de noite, mas não sei nada de ti à luz do dia. Ou conta-me tudo nas horas em que tens impedido que a tua voz se ouça por motivos em que foste levado ao engano. Apetece-me a mim ouvir-te agora, mas este teu dia tem mais para te oferecer do que a voz que já conheces. Não te quero fazer perder mais nada, nem mesmo, e a custo, a próxima hipótese que tiveres de ser feliz acompanhado. Parabéns (a tudo o que já conseguiste).

1 comentário:

Anónimo disse...

"Peço-te que não contraries a maior certeza que tenho na vida." contrariam sempre por mais que não queiramos que o façam !