(Metro em Paris, por Bruno Miguel Silva)
Há uma vida de tresloucos desejos que embebedam a alma até à exaustão! É uma falácia a crença na eternidade do sentimento, já que este muitas vezes existe porque o amante se lembra de o não esquecer. Isso de amar porque se lembra… ai devia ser um acto espontâneo, diferente de arquétipos que estrategas audazes criam para nos fazer embalar neste estado tão perfeito e ao mesmo tempo tão incapacitante!
Acho que vou reeditar o amor, tentar que o aspecto lhe seja alterado, desde a vascularização mais profunda. Não sejamos encorajadores desse sentimento forçado que ornamenta as janelas do peito que se parece encher de paixão.
É autêntico quando nos ataca sem medo, pautado de lugares por ocupar e momentos por viver… Não precisamos de nos lembrar que não podemos esquecer.
Ganha forma quando estou a olhar para o abstracto e tu entras em mim. A tua marca aparece assim, presumivelmente no acaso do tempo, quando nem é preciso estar escancarado um leve traço de ti nas coisas que me lembras. É espontaneamente, nas alturas em que inconscientemente me percorres em arrepios que caminham sobre a pele.
Já estiveste em Lisboa comigo de mãos dadas quando o metro chegou com a sua velocidade a decrescer sabias? Naquele preciso momento em que eu não estou atrás da linha amarela que emoldura a seguridade, quando a estou a pisar e a primeira carruagem, a que dita o caminho, aparece diante de mim com uma velocidade ainda tal que me faz fechar os olhos de repente enquanto o meu cabelo voa para trás e eu sorrio por achar graça ao súbito vento que me traz uma lufada de ar fresco à rotina diária. Não são mais do que dois ou três segundos em que já estiveste mesmo com a tua mão na minha e eu sorria para ti e para mim, de tanta felicidade por apareceres sem eu esperar que voltasses. E ao apareceres no escuro, tornaste-o tão agradável. E num ápice, de olhos fechados, eu queria ficar ali, não no escuro, por mais encantador que pudesse ser. O que eu queria era o momento daquela lufada de ar a ir contra mim e a mudar-me o dia mais uma vez, na expectativa que dessa vez fosse para sempre . Porque é aí o pico, quando a recta deixa a constância e a linearidade e fica acentuadamente apetecível.
Seria com a mesma rapidez de um estalar de dedos que a minha vida mudava. Em amostras de tempo cairia o pano denso e alterar-se-ia o cenário. Ficaria mais leve, mas ia preencher mais o ambiente, decerto.
É delicioso quando estás comigo sem o saberes, como se te capturasse do teu interior e trouxesse para mim a minha parte preferida de ti porque não precisas do resto que lhe inventas. E em tantos desses momentos eu encosto-me a ti, inclino a cabeça na segurança que me dás e tu enrolas o teu braço sobre mim, para teres a certeza que estou contigo e que é real. E passamos assim horas e horas, tu a entrelaçares ocasionalmente os teus dedos nos meus, isso a antecipar e a impedir a altura em que eu te ia despentear, como em tantas outras vezes, depois de estar a olhar para ti com aquela cara de quem se ri sem querer e de olhos bem abertos, tudo por teres estado a brincar comigo. E depois aposto que ia fingir que me estavas a irritar e então ia fechar os olhos depressa e com força para tentar não me rir, mas a verdade é que preferia que me estivesses a dar a mão. Mas então ia acabar por me rir, e para o evitar iria trincar o lábio inferior só para não te dar razão. Mas depois tu aproximavas-te de mim e roubavas-me um beijo. E depois de te afastares da minha cara eu ia abrir os olhos mais devagarinho do que costumo e ia sorrir ao mesmo tempo, para melhor sentir a alegria autêntica de estar contigo.
Não são gestos ou comportamentos desenhados ou programados em tua função. É como eu estou a imaginar essas horas de deleite por te ter ao meu lado. E como antecipo, em viagens que fiz pela minha memória, as minhas e as tuas reacções que sei um bocadinho de cor.
2 comentários:
e é tão bom sentir tudo isso que descreveste tão bem. viveste, sentiste, guardaste. :)
e poderás viver tudo outra vez
aiii 21 de maio vai ser só emoção!
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